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REFORMA E REVISIONISMO SOB A PERSPECTIVA ECONÔMICA: A GRANDE AJUDA AO CAPITALISMO E UMA VITÓRIA DE PIRRO.


Sob o ponto de vista da política - econômica, se submete à crítica os reformadores do século XX, abarcando o período pós-guerras e que coincide com o período da guerra fria, que permitiram a relação democracia - capitalismo sobreviver apenas enquanto, com suposição, o sistema não foi completamente capitalista. Igualmente, submete-se à crítica os reformadores do século XXI, alinhados com o mercado e sem nenhuma perspectiva socialista, que sequer enxergam as restrições benéficas ao sistema capitalista.





1. Introdução.

         Texto republicado neste site, sob o título “a crítica de Lênin  aos reformistas do século XX nos ensina a compreender os reformistas do século XXI” (1), me despertou o velho tema sobre “reforma ou revolução”, entre outras provocações. Retomo o assunto neste novo post.
         O objeto aqui é submeter à crítica os reformadores do sistema capitalista, pois se trata de saber se as reformas defendidas por eles (reformadores), sob a perspectiva política, são táticas ou estratégias para a ação revolucionária, isto é, para a implantação do processo socialista de substituição do sistema capitalista até se alcançar o comunismo.
         Sei que o debate entre reforma ou revolução tem vários significados importantes para os comunistas. O texto que faço referência demonstra a clássica visão de Lênin sobre o assunto. Outros textos podem trazer transcrição de Rosa Luxemburgo sobre o tema; ou mesmo transcrever  certos marxistas contemporâneos, como pode ser visto no texto também publicado neste site, intitulado “o marxismo arrogante: a crítica ao marxismo ocidental” (agora de modo mais objetivo e didático). Contudo, desde logo aviso que aqui passarei distante de muitos desses importantes debates e, em outras vezes, meramente tangenciarei tais temas.
         Ou seja, permaneço no diálogo para avançar no debate na linha escolhida, qual seja, colocar o debate agora sob o ângulo econômico. Evidentemente que não se trata de reducionismo econômico, mas da escolha do recorte a ser dado ao tema, para identificar outro campo de ação dos reformadores, a saber, a dimensão econômica, que evidentemente não é separada da dimensão política e outras, perfazendo a totalidade para compreensão do sistema capitalista.  

2. A Crise do Sistema Capitalista e a Crise dos Reformadores
         Seis anos se passaram desde 2008, o ápice da crise do sistema financeiro internacional e que demonstrou o vazio social que é a política neoliberal, uma vez que foi a primeira vez que analistas defensores do sistema criticaram o próprio sistema neoliberal.
         De qualquer modo, enquanto a memória estava fresca demandas e projetos de reforma do sistema, visando proteger o Mundo de uma nova crise, abundaram. Conferências internacionais e reuniões de cúpula de todos os tipos seguiram quentes e entravam na mídia a todo momento. Nada obstante, metade de uma década depois, quase nada foi implantado de fato. E o sistema financeiro, palco original do desastre, é alvo de recuperação: lucros, dividendos, fundos hedge, ataque aos países soberanos (fundos abutres e Argentina), salários e bônus estão de volta, enquanto a re-regulação permanece atolada em negociações internacionais, propostas de especialistas, papelada burocrática e, não menos importante, de lobby internacional.
         É interessante lembrar que até o período das duas guerras mundiais, capitalismo e democracia sempre foram considerados adversários. Somente no período pós-guerra que ambos sugeriram reconciliação, muito embora fosse uma falsa percepção. Mas vamos lá, admitamos isso para entrar na visão de mundo dos reformadores: Só no Mundo pós-guerra, que coincide exatamente com o período da guerra-fria, que o capitalismo e a democracia aparecem alinhados, inclusive com a argumentação de que o progresso econômico possibilitou que a maioria da classe trabalhadora aceitasse o livre mercado, o regime da propriedade privada, fazendo parecer que a liberdade democrática e algumas conquistas sociais fossem inseparáveis, ou que dependiam da liberdade dos mercados e da busca do lucro.
         Em outros termos mais diretos, a legitimidade da democracia no pós-guerra foi baseada na premissa de que os Estados tinham uma capacidade de intervenção nos mercados e corrigir os seus resultados colaterais, visando o interesse dos cidadãos.
         Entretanto, não se discute e sequer se examina como foi fácil a transformação da economia capitalista do período pós-guerra, que genericamente chamo de “capitalismo keynesiano”, para o irônico e trágico “capitalismo hayekiano” (2). Explico: A suposta democracia igualitária, caracterizada pelo capitalismo keynesiano como economicamente produtiva, é considerada um empecilho para a eficiência econômica pelo contemporâneo capitalismo hayekiano, pois o crescimento econômico se dá mediante o isolamento do mercado em suas vantagens comparativas para então retornar em um mercado global livre para trocas. Evita-se, a todo custo, as supostas distorções das políticas distributivas.
         E mais, apesar da crise é fato que o capitalismo hayekiano continua hegemônico, pois a própria Chanceler alemã, Angela Merkel, em declaração pública perante uma Comunidade Europeia em crise, criou a retórica da “democracia alinhada com o mercado” (marktkonform), de modo que o Legislativo (com seus políticos que criam políticas populistas) não gere aumento de despesa e observe o orçamento com responsabilidade fiscal (3).
         Um olhar acurado no Mundo que nos cerca mostra como a proteção institucional da economia de mercado do capitalismo hayekiano avançou nas últimas décadas, contando com a base e o apoio da intervenção estatal e democrática daquele capitalismo keynesiano.
         Logo, o grande derrotado pela adoção das políticas neoliberais, isto é, pela instauração do capitalismo hayekiano, foram os reformadores econômicos, aqueles que acreditaram que o capitalismo poderia ter um rosto mais humano a partir da intervenção estatal, isto é, o capitalismo keynesiano.
         O colapso do chamado socialismo real e o apogeu dos governos de Ronald Reagan (EUA) e Margareth Thatcher (Reino Unido) colocou fim a ideia de que o capitalismo moderno podia ser executado como uma economia mista (termo corriqueiro perante a esquerda dos anos 60-70), isto é, tanto tecnocraticamente gerido, como democraticamente controlado. (4)
         Imaginar que o sistema capitalista poderia ser encerrado por um conjunto de leis e decretos, que formulam e implantam políticas sociais, pensados e geridos pelos técnicos do governo e amparados em cartas constitucionais e/ou legislações superiores é considerar o capitalismo eterno. Na verdade, foi o socialismo real que estava em Moscou e os governos de diversos países de economia mista que, respectivamente, com ajuda da burocracia e/ou da democracia representativa liberal (entenda-se os reformadores), foram encerrados por leis e decretos que extinguiu a URSS ou desmantelaram as conquistas sociais.

3. A Política dos Reformadores foi Vitória de Pirro.
         As políticas defendidas pelos reformadores e revisionistas se transformaram em ações colaboracionistas, quer eles soubessem disso ou não. Elas passaram a ser objeto final da estratégia política de mudança da organização social, afastando-se de qualquer plano, posterior e contínuo, para o socialismo.
         Mas isso é apenas a superfície do problema. O grave é que hoje em dia se tornou incontestável que o sistema capitalista (em seus países centrais) destruiu qualquer agência estatal que pudesse estabilizá-lo, limitando-o.     E qualquer comentário sobre os BRICS (5) e sua política alternativa perpassa pela periferia do sistema capitalista e deve ser objeto de outro texto, sob pena de extrapolar o recorte dado.
         Uma das únicas questões que o sistema capitalista podia ter aprendido após 30 anos gloriosos (sic), ou pós – guerras, era que a estabilidade do capitalismo como um sistema socioeconômico depende da sua própria dinâmica, de modo a ser contido por forças de compensação por interesses e instituições coletivas que perfazem uma espécie de balanço social. Nada obstante, tais ações reduzem a taxa de lucro do capitalista, que se sujeita somente a lógica da acumulação de capital.
Assim, o esgotamento da crença nos reformadores e de suas políticas econômicas redundou que nenhuma força está nas mãos de um suposto desposta para reverter à tendência de queda no crescimento econômico, de igualdade social e de estabilidade financeira, inclusive, de acabar com o reforço mútuo do próprio sistema.
Aliás, não sem uma ironia que se perfaz trágica para a classe trabalhadora, em contraste com a década de 1930, não existe hoje nenhuma fórmula política – econômica dada ou sugerida pelos reformadores no horizonte que pudesse fornecer as sociedades capitalistas um regime de regulamentação. Os reformadores, talvez bem intencionados, ofertam palavras vazias de “um outro Mundo é possível”.
 E observo que as correções provisórias concebidas para enfrentar a crise são sempre mais do mesmo, ou como diz Angela Merkel, uma democracia alinhada ao mercado; bem como são propostas de curto prazo, que vão entrar em colapso sob o peso dos desastres diários produzidos pelo sistema capitalista em profunda desordem.
Logo, a suposta oposição ao sistema capitalista pelos reformadores do período pós-guerra foi uma vantagem para o sistema e um passivo para a classe trabalhadora, que desde os anos 80 do século XX paga essa dívida (6). Trata-se de uma vitória de pirro.
E mais, os reformadores do século XXI que são “democraticamente alinhados ao mercado” representam uma desproteção total à classe trabalhadora, pois colaboram para um sistema social uniforme, homogêneo, de princípios organizadores que permite ao capital dedicar-se a sua única finalidade (de lucro), ainda que isso reflita para a insustentabilidade do sistema e do Mundo. Caminhamos para barbárie ou para a revolução.
        
Referência:

(1) Texto publicado em 16-12-1910 no jornal Zvezdá. Texto retirado na íntegra da Fundação Maurício Grabois, sob o título “Divergência do Movimento Operário Europeu”.
(2) Evidentemente baseado na proposta de política econômica de Keynes e Hayek, que aqui é apresentado de modo amplo e genérico, como símbolos de um modo de pensar (visão de mundo), que a bem da verdade essas correntes dispõem de várias facções, mas com ponto em comum: a defesa do sistema capitalista.
(4) Vale a pena a leitura crítica à economia mista. MATTICK, Paul. Marx e Keynes, os limites da Economia Mista. Lisboa: Antígona, 2010, 496 p.
(5) BRICS é a sigla de alguns países emergentes (outrora chamados de em desenvolvimento), Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.

(6) A bem da verdade, a classe trabalhadora paga uma indevida dívida desde sempre. Ali se construiu uma figura retórica para melhor entendimento.



























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