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CRÍTICA AO PAPO DE REACIONÁRIO- EPISÓDIO: "Esquerda caviar, esquerda do iphone"

Devido a muitas críticas que nós "de esquerda" recebemos por consumirmos celulares, tecnologias e produtos de "marca". Este texto exprime exatamente a minha opinião e crítica em relação ao discurso oportunista por parte de reacionários.


Nas palavras de Marx “O comunismo não priva nenhum homem do poder de se apropriar dos produtos da sociedade; tudo o que ele faz é privá-lo do poder de subjugar o trabalho de outros por meio de tal apropriação” (citado por GABRIEL, Mary. Amor e Capital: a saga famioliar de Karl Marx e a história de uma revolução: Rio de Janeiro: Zahar, p. 167-168, 2013. Retirado pela autora de Karl Marx and Friedrich Engels. Collected Works, vol. 1-50. Moscou, Londres, Nova York: Progress Publishers, International Publishers, and Lawrence & Wishart, 1974-2005, p. 500). *


Pessoas de mentalidade conservadora/direitista pensam saber o que é ser de esquerda e poder ensinar para quem é de esquerda o que significa sê-lo. E o que parece se depreender de uma postura de esquerda coerente, segundo os reacionários, é ser um eremita. Afinal, nada melhor para a direita se toda a esquerda fosse morar em comunidades hippies ou em Cuba. Os ricos respirariam aliviados, pois seus inimigos não criariam problemas gravíssimos, como denunciar injustiças e participar de mobilizações populares.
Muito pior que isso, no entanto, é defender abertamente e incentivar o consumismo individualista e desenfreado como privilégio de alguns bem-nascidos, estigmatizando quem sofre com baixos salários ou desempregado como “vagabundos” e coisas semelhantes. É muito mais “feio” naturalizar desigualdades extremas, patrimônios exorbitantes e exclusão social. Porque aí não se trata apenas de um comportamento privado “feio”. É também o comportamento público horrendo. É uma conduta integralmente perversa.
Uma parte importante da esquerda busca uma reforma dentro dos limites do capitalismo, para redução das desigualdades, exclusão e exploração mais extremas. Outros tentam ir além, procurando meios de superação do modo de produção capitalista. A questão chave é a redistribuição dos produtos e meios do trabalho que se encontram concentrados nas mãos, principalmente, de quem não trabalha, mas é proprietário do capital.
De uma perspectiva de esquerda, ou seja, do igualitarismo social, não há lugar para repúdio à tecnologia, apenas as suas funções e usos numa sociedade injusta. Não condenamos todo e qualquer uso da energia nuclear, se denunciamos o bombardeio de Hiroshima e Nagasaki como um ato genocida. A energia nuclear tem muitos usos pacíficos. Da mesma forma que os iphones e ipods provavelmente tem outros usos, além da ostentação consumista.
O problema para a esquerda não é a tecnologia dos ipods e iphones, é a falta de acesso universal à alimentação, moradia, vestuário, transporte coletivo, educação, saúde, aposentadoria e trabalho digno. E também a cultura e meios de comunicação. É a existência de uma ínfima minoria riquíssima, em contraste com grandes massas relativa ou absolutamente pobres e desamparadas.
O que impõe limites à difusão dos ipods e iphones não é a esquerda. É o planeta. Os recursos são limitados, e a generalização de um padrão de consumo como o dos estadunidenses (que são pouco menos de 5% da população mundial e concentram 25% da renda, além de consumir 30% do petróleo), exigiria quatro planetas. Aí é que há limitação legítima do consumo: pela sustentabilidade ecológica de longo prazo. É por isso que melhorar e expandir o transporte coletivo e ciclovias é preferível a universalizar o casso pessoal. Em qualquer um desses casos, trata-se de uma questão coletiva, objeto de políticas públicas, e não de escolhas privadas.
Isso significa que o homem ou mulher de esquerda, como já disseram muitos reacionários, deveria doar sua renda individual? Esse ato seria indiferente. Não é raro que o esquerdista que siga esse conselho seja em seguida acusado de demagogo… Parece que é impossível a pessoa de esquerda ser coerente, não acham? Na verdade, a filantropia é uma escolha privada. A opção pela esquerda é política, diz respeito a decisões de alcance coletivo, e, primeiramente, ao modo de governar e utilizar o Estado.
A economia capitalista certamente não funcionaria caso todos os ricos fossem adeptos da total filantropia, e escolhessem viver com uma renda equivalente a um salário modesto, dividindo todo o resto. Afinal, quem trabalharia para produzir a riqueza?
A esquerda não defende a filantropia, que é uma escolha privada, possível apenas para quem já tem muito mais do que precisa. A filantropia se baseia uma relação de dependência entre o doador e o beneficiário. Às vezes o filantropo tira maior benefício para si deste ato, pois adquire prestígio e influência (e em muitos casos, consegue esconder a sonegação de grandes somas). A esquerda promove a solidariedade, que é a ajuda mútua entre iguais, e políticas públicas, ativas e coativas de redistribuição de renda.
Sim, coativas. Um imposto de renda progressivo é coação. Qualquer imposto é coercitivo – então que ao menos seja justo. Esse imposto arrecadado deve ser direcionado para um investimento social eficiente, que beneficie aos mais pobres (Bolsa-Família, reforma agrária, etc) ou a todos (educação e saúde públicas, transporte coletivo, etc).


Ilustração blog Questão Imperativa
Antes que digam que isso é um atentado à liberdade, gostaria de lembrar que a propriedade privada é tremendamente coativa. A propriedade privada é exclusiva: o bem é apropriado por um, que faz dele o que bem entender, quando é excluído do usufruto de todos os outros. Grande parte da violência policial e encarceramento é repressão aos crimes contra a propriedade privada. Grande parte da criminalidade de rua é tentativa de obter propriedade privada por meios ilegais. Qual liberdade proprietária tem o miserável, que nada tem para si? A liberdade individual do pobre é ser escravizado pela necessidade. Uma redistribuição de riquezas desigualmente distribuídas é a maior promoção da liberdade, pouco importando que seja realizada mediante coerção política e jurídica.
Ser de esquerda, portanto, não é ser contra qualquer tecnologia X por ter sido inventada numa sociedade capitalista, feudal ou escravista, mas, pelo contrário, lutar pela socialização dos benefícios do progresso tecnológico. E desde que (re)descobrimos a finitude dos recursos do planeta, de um modo que não comprometa o futuro dos nossos filhos, netos e bisnetos.
E viva la tecnologia!






Fonte do texto: Blog Desmentindo Reacionários, clique aqui e acesse.
* Citação contribuição do colaborador Sociedade Poder e Direiro- Helio RSJ.

É permitido o compartilhamento desta publicação e até mesmo a edição da mesma. Sem fins lucrativos e cite a fonte. Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional

Comentários

  1. Muito bom esse texto. Só achei estranho ele apoiar o que para mim é o grande defeito da esquerda. Aliás, da esquerda morta que não faz absolutamente nada para mudar a nossa triste realidade.

    O texto diz que "A esquerda não defende a filantropia, que é uma escolha privada, possível apenas para quem já tem muito mais do que precisa. A filantropia se baseia uma relação de dependência entre o doador e o beneficiário. Às vezes o filantropo tira maior benefício para si deste ato, pois adquire prestígio e influência (e em muitos casos, consegue esconder a sonegação de grandes somas). A esquerda promove a solidariedade, que é a ajuda mútua entre iguais, e políticas públicas, ativas e coativas de redistribuição de renda."

    Antes, vejamos o que significa filantropia: Os donativos a organizações humanitárias, pessoas, comunidades, ou o trabalho para ajudar os demais, direta ou através de organizações não governamentais sem fins lucrativos, assim como o trabalho voluntário para apoiar instituições que têm o propósito específico de ajudar os seres vivos e melhorar as suas vidas, são considerados atos filantrópicos.

    Vamos lá! O conceito de filantropia não especifica que tais ações filantrópicas só são possíveis de serem prestadas apenas por quem "já tem muito mais do que precisa". Conheço muitas pessoa de esquerda, esquerda ativa, que não têm muito, mas não se abdicam de ajudar o próximo. Dizer também que "a filantropia se baseia em uma relação de dependência entre doador e beneficiário" para mim é outro absurdo. Levou em consideração apenas que a ajuda (um tipo de filantropia), acontece apenas por meio de doação de dinheiro ou bens materiais. Mas os trabalhos voluntários, muito importantes por sinal, feito por pessoas e ONG's estão aí para provar que não é bem assim. E por último, o maior erro: "A esquerda promove a solidariedade, que é a ajuda mútua entre iguais, e políticas públicas, ativas e coativas de redistribuição de renda". Partindo desse pressuposto, apenas os governantes ou ricos de esquerda podem ser solidários, o que não é verdade! Claro, que para ser solidário a um coletivo de pessoas dentro do sistema capitalista, é necessário ter boas condições financeiras ou ser um governante que faça políticas públicas para tal, mas a meu ver, qualquer ato de solidariedade é bem vindo, inclusive aqueles feitos por pessoas de baixa renda. Eu tenho ojeriza a maioria dos discursos de direita, além ter grande simpatia com a Esquerda. apesar de tudo, ainda não me julgo de esquerda. Mas se um dia eu me auto definir um esquerdista, serei adepto de práticas filantrópicas, nem que só tenha condições de ajudar uma pessoa sequer. Para mim o que vale é a intenção. Já dizia Bono Vox: "Eu não posso mudar o mundo, mas posso mudar o mundo em mim."

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  2. Quer dizer então que por sermos socialistas em pleno sistema capitalista não temos nenhum direito de irmos ao shopping? Então agora o normal de acordo com os grupos reacionários é que todo socialista vá morar em latifúndios em barracos de lona?

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  3. O Socialismo ou o Comunismo está na mente e não na roupa.

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  4. VAMOS DESAPROPIAR E CONFISCAR OS BENS E A RIQUEZA DOS EXPLORADORES COMUNISTAS! A RÚSSIA E EUROPA DO LESTE, FIZERAM ISSO EM 1989, E MANDARAM OS EXPLORADORES SOCIALISTAS PRA O INFERNO!

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